Entrevista com escritor - Flávia Savary

Flávia nasceu à beira-mar e mora em Teresópolis, serra fluminense. É casada com Braz Nascimento, um músico.
Sua mãe, é a poeta Olga Savary, e seu pai, o cartunista Jaguar.
Formou-se em letras, Português-Inglês. E trabalha com literatura infanto-juvenil há mais de trinta anos.

Entrevistei a escritora, que é super simpática! Confiram:

Com quantos anos você começou a escrever histórias?
Memória é o meu fraco. E por fraco quero dizer exatamente isso: fraco, zero à esquerda.
E como desse mato não vai sair cachorro (nem lembrança!), não digo com quantos paus (ou com quantos anos) se faz uma canoa (ou o primeiro livro), mas conto sobre a cara da canoa.
Minha primeira história foi uma HQ, História em Quadrinhos, pros leigos. Ela data da infância. Priscas eras, gente boa, já que nasci no século passado.
A tal HQ falava de quê? História de terror, gênero que muita gente não associa a menininhas lourinhas de trancinhas.
Era sobre uma aranha gigante, vinda das profundezas do mar, que invadia uma cidade, subia nos prédios, comia gente, um horror total. Não lembro como acabava.
Agora, o mais interessante é como a história surgiu: de uma visita ao Museu da Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, onde vi (de fato, não é lorota!) a tal aranha gigante, empalhada dentro de uma vitrina. Ou seja, a arte imita a vida. Ou será que é vice-versa? Ou vice-versa de vice-versa? Vocês descubram aí...
Qual o público-alvo que você tenta atingir, ao escrever um livro?
Meu público-alvo é só um: gente viva, munida de cérebro (mesmo que apenas com os bons e velhos Tico e Teco) e um coraçãozão (este tem de ser grande e aberto).
O preferencial é a galera jovem (juventude não é um dado cronológico, saibam, mas gente com muita asa nas ideias. Já conheci menina de 15 anos mais velha que minha avó!).
E por que a preferência recai sobre a galerinha? Conclamo um grande escritor pra me dar uma mãozinha, C. S. Lewis, autor de Crônicas de Nárnia, pra citar só um título de sua vasta e riquíssima obra: “(Lewis) explicou que escrevia ‘uma história infantil porque uma história infantil é a melhor forma de arte para algo que se queira dizer’”. Precisa dizer mais alguma coisa?
Qual o livro que a fez gostar de literatura? Por que?
Não foi um livro que me fez gostar de literatura, mas ver duas pessoas que eu amava, desde cedo, com a cara enfiada nos livros: meus pais. Mais minha avó que SEMPRE (atentem, pais e parentes, para a importância da palavra em capitulares) lia para mim e meu irmão, antes da gente dormir.
De maneira que ler, digamos assim, era um “meio ambiente” em nossa família.
E, claro, a primeira coisa que me caiu nas mãos, como acontece com a maioria dos guris e gurias, é o gibizão. Estamos falando de primeiras letras, certo?
Depois vieram os livros com mais ilustrações que texto, daí os contos de fada, e o caminho foi se fazendo mais largo.
Tudo a seu tempo, nada de querer empurrar Dostoiévski, banquete dos mais suculentos e temperados, goela abaixo de quem tá acostumado a comer papinha! “Há um momento para tudo e um tempo para todo propósito debaixo do céu”, diz, sabiamente, um dos livros sapienciais das Sagradas Escrituras, o Eclesiastes.
Qual a importância da internet em seu trabalho como escritora?
Facilita bastante, divulga (momento propaganda: visite o sitewww.flaviasavary.com) e tal e coisa, mas não sou exatamente o que se pode chamar de fanzoca da rede.
Admiro pra caramba quem sabe tirar proveito do veículo. Acho bacana as campanhas positivas veiculadas na rede, mas, sério, nem tudo o que cai na rede é peixe...
Há que se cultivar muito espírito crítico ou você pode acabar levando gato por lebre. A este respeito, recomendo a leitura de um livro essencial, 1984, de George Orwell. Nele, você vai descobrir o que, de verdade, significa o tal Big Brother que, no Brasil, virou programa de nerd.
Se liga, galera: dentro daquilo que parece um filé, pode ter uma isca. E o peixe só descobre que a minhoca era uma roubada, depois de ferrar o dente nela.
A parte final da pergunta é uma espécie de “mensagem cifrada, a vulga metáfora: papo que só leitores vão poder decifrar... Trate de ler, pois, senão você fica à margem da vida!
Escreve ficção ou não?
SÓ ficção, de preferência. Graças a Deus, nunca me pediram pra escrever um “caso verdade”. Meu negócio é inventar. E quanto mais delírio, melhor!
Quais os gêneros literários que prefere ler?
Adoro ler os colegas escritores de minha área, a literatura infantojuvenil. Mas é claro que também bebo das fontes clássicas, os mestres memoráveis.
Entre os gêneros literários, escolho, sem ordem de preferência, dramaturgia, poesia, crônica, conto, romance.
Tipo tudo, né? Só não tenho muita afinidade com ensaio, relatos biográficos (exceção feita à vida dos santos) e narrações históricas. O tempo é curto, há que se escolher. E, mesmo escolhendo, não vai rolar vida suficiente pra que eu leia (e escreva!) tanto quanto gostaria. E olha que sou uma workoholic!
E os que prefere escrever?
Acho que a resposta tá embutida na pergunta 5. Volta o filme até lá. E me sinto confortável produzindo textos nos mesmos gêneros que gosto de ler.
Quais os escritores de que mais gosta? E os livros?
Resumindo o resumo dos resumos, pincei uns poucos, entre tantos. Caminhando pela própria história, os clássicos Andersen, irmãos Grimm, Perrault, nosso Lobato, a mitologia grega. De preferência, TUDO ILUSTRADO! Livro sem desenho (até hoje penso assim) me dá a impressão de que falta algo.
Amores à primeira vista foram Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll (quem souber ler no original, prefira a edição comentada de Martin Gardner: um tesouro e uma chave do tesouro, ao mesmo tempo). Mestres Câmara Cascudo e Ariano Suassuna. Todo o teatro e poesia de Garcia Lorca. A obra de Neruda. As belas e tristes crônicas de Rubem Braga. O humanismo de Saint-Exupéry. A barbárie da Segunda Guerra em A trégua, de Primo Levi, elevada à obra de arte.
Na adolescência, não teve pra ninguém: Cem anos de solidão, de Gabriel García Marquez!
Imperdível também é Italo Calvino e suas Fábulas italianas, por exemplo. Sério, sempre que bater aquela tristeza que nada dá jeito, aplique Calvino na veia. É tiro e queda: você sai da poltrona e cai direto numa tarantela!
Qual a importância da literatura para as pessoas, nos dias de hoje?
A literatura, como as artes em geral, cada qual com sua viagem e riqueza particulares, sempre teve e terá seu lugar garantido nos corações e mentes de quem ainda têm um pouco dos dois. Atenção: se liga, galera! Tão querendo tirar isso de vocês. E os meios não são poucos! ‘Bora abrir o olho pra não virar peça de jogo, de engrenagem, de sucata, enfim.
A literatura desperta, por isso ela sempre foi considerada tão perigosa, ao longo da história. Ela também embala, alimentando sonhos mais altos do que o muro que cerca muita verdade e beleza. Literatura não nasceu pra ser muro, ela é ponte, asa.
Ela conduz quem lê ao fundo das coisas. E o fundo mais perigoso de todos é o fundo da própria pessoa, sua consciência, essência, alma. Quanta coisa há pra se descobrir aí!
Quem lê, aprende a fazer escolhas, selecionar. A pessoa que lê passa a enxergar. E o que não falta, nos dias de hoje, é gente fazendo muito barulho, jogando fumaça nos sentidos da turma, a fim de que ela não veja, sinta, nem pense em nada. Fique oco e caia de boca numa rave frenética, se esquecendo de quem é, o que deseja de verdade, o que vale a pena sentir e pensar.
Você aí, por exemplo, tem certeza de que não falando, vestindo, pensando, planejando seu futuro bonitinho, igualzinho ao que seu “mestre” mandar? Você ainda é capaz de alcançar o que rola no seu interior ou a zoada arquitetada já o(a) tornou surdo aos seus desejos?
Vai ler um livro, xará, pra nadar numa água que não afoga, mas leva a mares nunca dantes navegados, aqueles que lhe cabem explorar. Saia da praia, se aventure!
Deixe uma mensagem aos nossos jovens leitores!
Caramba, me empolguei tanto na resposta anterior que entrei pela pergunta seguinte, quase a respondendo!
Mas como mensagem final é mensagem final, o que teria dizer à galerinha é o seguinte: a gente sente fome disso ou daquilo, não vou entrar em detalhes, mas alguém se lembra de que temos uma alma que também morre à míngua, quando não alimentada? Não sabe o que é “míngua”? Cate no dicionário!
Penso que é aqui que nossas culturas, com toda sua modernidade e tecnologia, têm falhado feio, deixando, no lugar de sua falência, um buraco.
A gente se lembra de encher tudo, da pança ao bolso, só não lembra de encher o espaço que nos difere dos animais, ali onde somos mais humanos: a alma.
Alma se alimenta com o impalpável, o transcendental. Mas se a gente só tem olhos pra ver o que existe, nunca vai chegar lá. E a vida é mais do que o que se vê, consome e usa. Cuidado: que só consome, some. Pense nisso. Ou melhor, sinta.
E sua alma, tem fome de quê?

11 comentários:

  1. Que bacana essa entreevista, adorei!!!
    beijuu
    www.sermulhereomaximo.com.br

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  2. Nossa!!! Adorei a entrevista. As perguntas foram muito bem formuladas e as respostas foram brilhantes... Estou com vontade de ler algum livro desta escritora.... PARABENS AO SITE (MARAVILHOSO) e PARABENS A ESCRITORA ( CRIATIVA E INSPIRADORA)...

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  3. Olá, Amanda!!
    Adorei a entrevista e a editora me pareceu ser uma pessoa super simpática. Gostei muito do ponto de vista dela e desejo pra ela boa sorte nesta jornada.
    Parabéns!
    Bjos.

    Mariana Ribeiro
    Confissões Literárias.

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  4. Adorei a entrevista! ela me pareceu ser muito simpática e atenciosa!

    Ah! Adorei muitooo seu blog e já estou seguindo!

    Beijos
    Thaís Varine
    Blog Os Bastidores do Amor

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  5. Eiiiii flôr,
    Tem selinho pra vc lá no blog, pega láá !! ;]

    Bjinhos ;*

    Pâm
    http://chiqueatodaprova.blogspot.com

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  6. Olá e ai tudo bem?
    Legal a entrevista...gostei xD
    Saudades de tuas visitas....
    Beijos e tudo de bom
    .......................
    RIMAS DO PRETO

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  7. Quanto tempo em amandinha rsrs ..
    enfim é veridica sim .. como advinhou ??? rs
    kisu

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  8. entrevista bem legal.
    Não conhecia a autora, mas achei ela simpática e fiquei curiosa para ler seu livro. ^^

    beijos e parabéns.

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  9. Adorei a escritora e a entrevista! Ela é muito simpática e engraçada. Se os livros dela forem assim, eu quero ler com certeza! Haha. Beijos e parabéns pela entrevista!

    @minha_estante - Minha Estante

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Ei, obrigada! :)

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