A gente posterga o eu te amo até o fim com medo do que o outro vai pensar. Mesmo com o coração gritando "vai!" com todas as forças, a mente cria um monte de paranoia e nunca saltamos para o outro lado com medo de cair no abismo. E para começar, acho que amar é exatamente isso: saltar sem medo do que há de vir. Andar de olhos vendados e segurar a mão de um estranho que, por acaso, se propõe a ajudar. Amar é correr riscos constantes. É errar o sabor preferido de picóle, é ceder e assistir um filme de um gênero que você não gosta, é pedir desculpas em forma de beijo. Amar é dar um pedacinho de si para o outro sem saber onde ele vai guardar. É acreditar no lado positivo do outro sem nem saber o nome dos seus pais ou seu endereço completo. É saber que ela estará na rodoviária da sua cidade caso as coisas fiquem pesadas demais para você carregar sozinho.
Só que o problema é justamente esse: temer o desconhecido nos faz criar uma bolha imaginária e viver sempre na zona de conforto. Hoje damos uns beijos e ficamos nisso; amanhã jantamos naquele restaurante bonito da rua da frente; depois talvez até possamos ir pra cama - mas sem depositar sentimentos, é claro. É nesse constante medo de se entregar, de relutar contra o que o próprio coração diz, que a gente nunca descobre que o outro sente igual. Que o encontro no restaurante bonito foi, sim, muito bom, mas que ela teria adorarado do mesmo modo caso a levasse num Mc Donald's qualquer. São nesses momentos em que damos voz ao silêncio, que nos aquietamos com medo de falar bobagem ou soar precipitado demais, que perdemos as melhores coisas da vida.
Perdemos um sorriso que começa pelos cantinhos da boca e logo toma conta do rosto inteiro, perdemos os olhos apaixonados que, agora espremidinhos, revelam um brilho fora do normal. Perdemos um abraço, um beijo mais intenso. Perdemos um "eu também te amo, muito". Perdemos um pouco de nós toda vez que optamos pelo sentimento velado, escondido embaixo do tapete empoeirado da sala de estar.
Ao contrário do que muitos dizem, amar não é limitar-se. Não é ignorar o mundo a sua volta, as saidinhas com os amigos e as festas no sábado a noite. Amar não é ter de ser outra pessoa porque assumiu um compromisso. Amar é estar tão bem consigo a ponto de saber que dividir um pouco da sua vida só vai te acrescentar. Vamos nos permitir pelo menos um passo no escuro, vamos aceitar aquela mão estendida quando estiver perigoso demais de atravessar a rua sozinho. Como cidadãos livres e independentes, deveríamos passar a enxergar o amor como mais um espacinho para conquistar a liberdade. E é pela liberdade do amor, dos sentimentos, e das formas de expressar o que já é visível à alma, é que eu dedico esse copo de coca-cola (mesmo sabendo que ele odeia quando me afogo nos refrigerantes, mas mesmo assim, me ama).